ANATOMIA DENTÁRIA EM CÃES E GATOS
A cabeça é dividida em mandíbula e o crânio. A mandíbula é formada por um par de ossos unidos rostralmente por um tecido fibroso que forma a sínfise mentoniana ou sínfise mandibular, que é permeada em ambos os lados por 2 ou 3 forames mentonianos e na superfície medial é permeada pelo forame mandibular. A inervação provém do ramo mandibular do quinto par craniano (trigêmeo), e a irrigação é fornecida pelas artérias facial. A mandíbula se articula com os ossos do crânio através do processo articular da mandíbula, que se encaixa na fossa mandibular do osso temporal e forma a articulação têmporo-mandibular.
Os músculos que executam o movimento de fechamento da boca são: m. masseter, m. temporal e m. pterigóides medial e lateral. O músculo que executa a abertura é o m. digástrico. Estes músculos são conhecidos como músculos da mastigação.
Os ossos incisivo, maxilar e palatino formam o assoalho craniano e suportam os dentes superiores, enquanto os dentes incisivos estão no osso incisivo, o canino, os pré-molares e molares estão presos ao osso maxilar.
A inervação do crânio é feita por ramos originados do nervo facial, glossofaríngeo, hipoglosso e trigêmeo, já a irrigação é realizada por ramos da artéria carótida e a drenagem por ramos da veia jugular.
A anatomia óssea está descrita nas figuras 1, 2 e 3, podendo-se observar que a dentição superior do cão e do gato está inserida na maxila e osso pré-incisivo e a inferior na mandíbula esquerda e direita.
Figura 1 – Vista lateral dos ossos do crânio.
Figura 2 – Vista dorsal dos ossos do crânio.
Figura 3 – Vista ventral dos ossos do crânio.
O palato duro é o tecido mole que recobre os tecidos ósseos do palato, ele possui uma rafe que o divide em direito e esquerdo. Dessa rafe saem cristas, denominadas rugas do palato. Caudalmente aos dentes incisivos centrais está à papila incisiva.
O palato mole é um tecido mole sem suporte que se estende por trás do palato duro, ambos tem a função de separação entre as cavidades oral e nasal.
A língua possui uma estrutura muscular intrínseca e extrínseca, é recoberta por uma membrana mucosa, sendo dividida em termos anatômicos em ápice, margem, corpo e raiz. Suas principais funções são a ingestão de fluidos e alimentos e a limpeza do animal.
As glândulas salivares são dividas em maiores e menores. As glândulas salivares maiores são a parótida, mandibular, sublingual e zigomática. No gato também estão presentes duas glândulas molares bem desenvolvidas.
Os dentes estão inseridos nos alvéolos dentários, sendo que para cada raiz dentária há um alvéolo. No interior dos alvéolos se localiza a placa cribiforme, que recebe a denominação de lâmina dura radiograficamente, marcada por uma linha radiopaca ao redor do alvéolo.
É importante distinguir as diferenças de cada espécie e de algumas raças (figura 4). Existem crânios dolicocefálicos, que são compridos e afilados (ex. Collies), crânios mesocefálicos, de relações medianas (ex. Poodles) ou crânios braquicefálicos, curtos e largos (ex. Pugs).
Figura 4 – Diferença entre crânios dolicocefálicos, mesocefálicos e braquicefálicos. |
Os cães e gatos tem uma dentição classificada como difiodontes, ou seja, possuem duas dentições consecutivas, a decídua e a permanente, embora não possuam dentes ao nascimento. E também são considerados heterodontes, pois apresentam dentes de formas diversas. Os dentes são parecidos quanto sua estrutura, mas variam de tamanho, forma e função. Quanto à evolução da implantação dentária são considerados tecodontes, já que os dentes estão inseridos nos ossos (alvéolos). Já em relação ao crescimento após erupção são considerados braquiodontes, são dentes curtos e seu crescimento é interrompido após erupção.
O dente erupciona devido ao constante crescimento das raízes, sendo que um dente maduro apresenta uma coroa e uma ou mais raízes. A parte da coroa próxima à raiz forma uma saliência horizontal chamada cíngulo.
Os dentes nos cães e gatos são divididos em quatro grupos, sendo eles, os incisivos, caninos, pré-molares e molares, tendo como função prender, cortar, dilacerar e triturar os alimentos respectivamente.
Todos os dentes incisivos (I) são unirradiculares, já que apresentam uma única raiz, as quais são finas e compridas. O tamanho desses dentes diminui do incisivo lateral para o medial, sendo os superiores um pouco maiores que os inferiores.
Os caninos (C) tem raiz única e longa e são os dentes mais compridos no cão e no gato. Sua coroa é levemente pontiaguda e curva, principalmente nos inferiores.
Os pré-molares e molares (PM e M) podem ter uma, duas ou três raízes. Na arcada superior dos cães temos o 1ºPM com uma raiz, o 2º e 3ºPM com duas raízes e o 4ºPM, 1º e 2ºM com três raízes. Já na arcada inferior todos os dentes possuem duas raízes, menos o 1ºPM e o 3ºM que tem apenas uma raiz. Na arcada superior dos gatos, temos o 2ºPM com uma raiz, o 3ºPM com duas raízes, o 4ºPM com três raízes e o 1ºM com uma raiz, já na arcada inferior o 3ºPM, 4ºPM e 1ºM possuem duas raízes.
É importante ressaltar que, tanto o cão como o gato, não apresentam dentes inferiores trirradiculares, sendo a furca a área de divisão das raízes em dentes com mais de uma raiz. A figura 5 e 6 ilustram a dentição permanente do cão e do gato.
Figura 5 – Crânio de cão mostrando dentição permanente.
Figura 6 – Crânio de gato mostrando dentição permanente.
A oclusão normal dos dentes permite o bom funcionamento e a comodidade oral. Ainda que possua pequenas variações aceitáveis conforme a raça, ao examinar a oclusão normal dentária nos cães, os dentes incisivos inferiores ocluem com o cíngulo dos incisivos superiores numa mordida em tesoura. Os caninos inferiores ocluem entre os incisivos superiores laterais e os caninos superiores de maneira equidistante. Nos pré-molares ocorre intercuspidação, ou seja, as cúspides ficam direcionadas para os diastemas (espaços entre os dentes) dos dentes opostos, não se encostando. Durante a oclusão o 4ºPM superior oculta o 1ºM inferior. A oclusão dos dentes incisivos e caninos dos gatos é análoga a do cão. O 4ºPM superior oclui o 1ºM inferior. O gato não possui dentes com superfícies oclusais para mastigação.
A primeira dentição, chamada, de dentição decídua é formada por 28 dentes no cão e 26 dentes no gato. A segunda dentição, denominadadentição permanente, por 42 dentes no cão e 30 no gato. No quadro 1, observa-se as fórmulas dentárias do cão e do gato, onde os dentes definitivos são representados pelas letras maiúsculas, enquanto os dentes decíduos pelas letras minúsculas. Os dentes decíduos vão sendo esfoliados e substituídos pelos permanentes, sendo que ao final do oitavo mês de idade todos devem ter erupcionado.
Fórmulas Dentárias do Cão e do Gato |
Decídua Caninos: 2 (i 3/3 c 1/1 p 3/3) = 28 |
Permanente Caninos: 2 (I 3/3 C 1/1 P 4/4 M 2/3) = 42 |
Decídua Felinos: 2 (i 3/3 c 1/1 p 3/2) = 26 |
Permanente Felinos: 2 (I 3/3 C 1/1 P 3/2 M 1/1/) = 30 |
Quadro 1 – Fórmulas Dentárias do cão e do gato. Os dentes definitivos são representados pelas letras maiúsculas, enquanto os dentes decíduos pelas letras minúsculas.
O Sistema Triadan Modificado emprega um sistema numérico de três dígitos para identificar cada dente na boca do animal, conforme figura 7 e 8. O primeiro número indica o quadrante no qual o dente está localizado e os outros dois números indicam a localização do dente dentro do quadrante, sempre iniciando com o incisivo central em direção distal. A dentição permanente é indicada com os números 1 no maxilar direito, 2 no maxilar esquerdo, 3 no mandibular esquerdo e 4 no mandibular direito. A dentição decídua pode ser designada com os dígitos 5 no maxilar direito, dígito 6 no maxilar esquerdo, dígito 7 no mandibular esquerdo e dígito 8 no mandibular direito.
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É essencial conhecer a terminologia usada para descrever a topografia e as relações dos elementos dentários (figura 9), que são relacionadas como faces:
Apical: face do dente em direção ao ápice radicular.
Coronal: face do dente em direção à superfície mastigatória. Também conhecida como face incisal nos dentes incisivos e caninos e face oclusal nos pré-molares e molares.
Vestibular ou Facial: superfície próxima à face, voltada para o vestíbulo bucal. Nos dentes incisivos e caninos é também chamada de labial e nos pré-molares e molares, bucal.
Palatina: face voltada para o palato nos dentes superiores.
Lingual: face voltada para a língua nos dentes inferiores.
Mesial: face voltada para linha média, denominada também como anterior ou rostral.
Distal: face voltada caudalmente, denominada também como posterior ou caudal.
Figura 9 – Terminologia direcional. |
O dente consiste em coroa, correspondente a porção acima da linha da gengiva e raiz, correspondente a porção abaixo da linha da gengiva. A ponta da coroa é conhecida como cúspide e a ponta da raiz como ápice. Os dentes são formados por esmalte, dentina, cemento e polpa.
O esmalte recobre a coroa do dente e é o tecido mais duro e mineralizado do organismo, sendo composto por 95% de hidroxiapatita de cálcio (calcificada, inorgânica), 4% de água e 1% de matriz do esmalte (matéria inorgânica). Não possui suprimento nervoso e sanguíneo, nem capacidade regenerativa. O colo do dente é localizado na junção cemento-esmalte.
A dentina corresponde ao principal componente de um dente adulto e é recoberta pelo esmalte em sua porção coronária e pelo cemento em sua porção radicular, sendo composta por 70% de hidroxiapatita de cálcio (calcificada, inorgânica), 20% de matéria orgânica (fibras colágenas) e 10% de água. A dentina primária está presente durante a erupção do dente, já a dentina secundária está presente após erupção dentária e vai se deposição normalmente as paredes internas do dente conforme este amadurece, diminuindo o diâmetro da câmara pulpar durante a vida do animal. É produzida pelos odontoblastos e formada em túbulos. A dentina terciária é produzida em resposta a um trauma, conhecida como dentina reparadora.
O cemento é um tecido duro e sem vascularização que cobre a raiz do dente, sendo menos calcificado que o esmalte e a dentina apresentando deposição lenta e continua por toda a vida do animal com capacidade de reparação e reabsorção.
A polpa é constituída por tecido conjuntivo frouxo, nervos, vasos sanguíneos e linfáticos, delimitada por odontoblastos na periferia Acâmara pulpar é a porção da cavidade pulpar dentro da coroa do dente, já o canal radicular é a porção da cavidade pulpar dentro da raiz do dente. O delta apical é a área do ápice da raiz onde o canal radicular comunica-se com os tecidos periapicais. No dente jovem é único com ampla abertura e no dente adulto é formado por numerosas foraminas. O fechamento do ápice e a consequente formação do delta apical no cão ocorrem em torno de 9 a 11 meses. As funções da polpa são: sensitiva, terminações nervosas permitem a sensação de dor a partir do calor, frio, perfurações, cáries, traumatismos ou infecções; nutritiva, transporta nutrientes da corrente sanguínea para as extensões da polpa que alcançam à dentina e protetora, responde às lesões formando dentina reparadora (pelos odontoblastos). Na figura 10, podem-se visualizar as estruturas do dente citadas no texto.
Figura 10 – Anatomia do dente. |
O periodonto é o conjunto de estruturas que constituem a articulação alvéolo-dentária e tem função de fornecer suporte e proteção aos dentes. As estruturas que compõem o periodonto são o ligamento periodontal, o cemento, a gengiva e o osso alveolar.
O ligamento periodontal é constituído por fibras de tecido conjuntivo denso (colágeno) que se fixam firmemente no cemento e no osso alveolar, pelas fibras periodontais (Sharpey), servindo como um amortecedor e sustentando o dente em seu alvéolo.
A gengiva circunda a porção cervical dos dentes, por meio do epitélio juncional, ela divide-se em gengiva aderida e gengiva marginal ou livre. A gengiva aderida se insere firmemente no periósteo do osso alveolar. A gengiva livre é um colar superficial de tecido que envolve a coroa dentária no osso alveolar e forma a parede externa do sulco gengival.
O osso alveolar é composto pelas cristas dos ossos da mandíbula ou maxila que sustentam os dentes. As raízes dos dentes estão implantadas em depressões profundas no osso, denominadas cavidades alveolares. O osso alveolar desenvolve-se durante a erupção dentária e sofre atrofia quando os dentes caem. Ele é constituído por quatro camadas. Além das três camadas existentes em todos os ossos (periósteo, osso denso e osso esponjoso), existe uma quarta camada chamada lâmina cribiforme, que reveste as cavidades alveolares. Vasos sanguíneos e nervos cursam através do osso alveolar e atravessam a lâmina cribiforme. A maior parte desses vasos sanguíneos e nervos se conduzem ao ligamento periodontal.
Confira o vídeo sobre anatomia dentária:
https://youtu.be/LOdVaXoOPpc
REFERÊNCIAS
KOWALESKY, J. Anatomia dental de cães (Canis familiaris) e gatos (Felis catus). Considerações cirúrgicas. Dissertação apresentada para o Programa de Pós-Graduação em Anatomia dos Animais Domésticos e Silvestres da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de mestre em ciências. 2005.
GIOSO, M.A. Odontologia veterinária para o clínico de pequenos animais. 2. ed. São Paulo: Manole. 2007.
GORREL, C. Odontologia de Pequenos animais. [Tradução de: Small animal dentistry: Carla Augusto Thomaz et al]. Elsevier, Rio de Janeiro, p. 171-177, 2010.
ROZA, M. R. Odontologia em Pequenos Animais – Rio de Janeiro: L.F. Livros de Veterinária, 2004.
PERRONE, J.R. Small animal dental procedures for veterinary technicians and nurses. Illustration by Brenda Gregory. USA: Wiley-Blackwell John Wiley & Sons, Inc, 2013. Disponível em: <https://download.e-bookshelf.de/download/0000/6661/03/L-X-0000666103-0001399321.XHTML/index.xhtml>.
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